IFBAE
IFBAE
Instituto Franco Brasileiro de Administração de Empresas
Institut Franco Brésilien d’Administration des Entreprises
Instituto Franco Brasileiro de Administração de Empresas

Gerenciar organizações em um contexto incerto: processos e práticas

 Por uma abordagem mais dinâmica, contextualizada e prática da gestão

A abordagem baseada na prática leva em conta as correntes teóricas das ciências sociais sobre a noção de hábito (Bourdieu, 1980), estruturação (Giddens, 1984) e teorias de práticas sociais (Schatzki, 2002, 2018; Reckwitz, 2002) que consideram que as práticas não são isoladas, mas aparecem como o resultado de um continuum de interações entre indivíduos inseridos em um determinado contexto. Para Reckwitz (2002, p. 249), uma prática é "um tipo de comportamento rotineiro, que consiste em vários elementos interligados: formas de atividade corporal, formas de atividade mental, 'coisas' e seu uso, além de conhecimentos básicos que consistem em compreensão, know-how, estados emocionais e motivações". Uma prática compreende o conjunto organizado de ações e diálogos, tarefas e projetos da organização (Schatzki, 2002).

Em gestão, levar em conta as práticas pode ser útil para explicar como as empresas se adaptam ao ambiente, conectando a organização a critérios internos e externos (Jarzabkowski et al., 2021). A integração de uma análise processual e de práticas em uma empresa permite observar sua capacidade de adaptação aos grandes desafios (Feldman & Orlikowski, 2011), contexto que exige a criação de novos diálogos entre profissionais e pesquisadores. Entra em pauta, por exemplo, a discussão de como as práticas são conduzidas para permitir que as organizações se reinventem e se transformem, aproveitando melhor novas oportunidades. A crise que atravessamos exige, mais do que nunca, uma reflexão crítica neste diálogo entre professores-pesquisadores e a sociedade civil. Com base em Jun (1994), Cunliffe (2020) une esta forma de reflexividade à prática em uma questão: como podemos desenvolver uma ação ética baseada no questionamento crítico das ações passadas e das possibilidades futuras?

Uma visão integradora da prática possibilita uma análise mais precisa e contextualizada por parte das organizações. Em tempos de crise, esta capacidade é essencial para agir melhor e ser capaz de modificar o contexto, seja para as próprias organizações ou para seus funcionários. Por exemplo, (Jarzabkowski et al., 2007; 2021) introduz o conceito de strategy as practice, no qual a estratégia se baseia em ações, em interações de múltiplos atores e em práticas nas organizações (práticas existentes, melhores práticas, criação e combinação de novas práticas). Em empreendedorismo e inovação, trabalhos recentes trazem esta visão prática sob o nome de entrepreneuring, para melhor abordar um processo de metamorfose (Hjorth, 2017) voltada à identidade do empreendedor. É através da coordenação das práticas e oportunidades diárias que será possível construir uma organização criativa (Johannisson, 2018). Em marketing, as abordagens por meio da teoria das práticas sociais são particularmente relevantes para compreender os processos de mudança nas práticas de consumo e as trajetórias das práticas individuais (Warde, 2005), em especial no contexto do consumo visando a sustentabilidade (Roques e Roux, 2018; Fuentes et al., 2019; Robert-Demontrond et al., 2020; Dyen et al., 2021). Em recursos humanos, as posturas críticas performativas identificam formas éticas de liderança favoráveis ao sensemaking, práticas mais sustentáveis e atraentes de gestão de pessoas e do trabalho, na intersecção do contexto organizacional e do trabalho real do funcionário (Thiel et al., 2012; Taskin, 2021).

Convidamos os autores a apresentarem trabalhos que contemplem práticas organizacionais, independentemente da disciplina: marketing, finanças, gestão de recursos humanos, contabilidade, controle de gestão, logística, sistemas de informação, empreendedorismo, inovação... O trabalho deve contribuir para uma melhor compreensão das práticas e processos e seus efeitos na adaptação das organizações a contextos incertos. A conferência IFBAE 2022 também está aberta a propostas de trabalhos sobre outros tópicos da ciência da administração.

 

Referências

Bourdieu, P. (1980). Le sens pratique. Paris, éditions de Minuit, le sens commun, 474p.

Cunliffe, A. L. (2020). Reflexividade no ensino e pesquisa de estudos organizacionais. Revista de Administração de Empresas, 60, 64-69

Dyen M., Siriex L. et Costa S. (2021) Bien manger et ne pas gaspiller la nourriture, une question d’organisation ?, Décisions Marketing 101 : 1-24.

Fuentes C., Einarsson P. et Kristoffersson L. (2019) Unpacking Package Free Shopping: Alternative Retailing and the Reinvention of the Practice of Shopping, Journal of Retailing and Consumer Services 50: 258-265.

Feldman, M. S., & Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing Practice and Practicing Theory. Organization Science, 22(5), 1240-1253.

Giddens, A.. (1984). The Constitution of Society: Outline of the Theory of Structuration. Univ of California Press.

Hjorth, D. (2017). Critique Nouvelle – an Essay on Affirmative-Performative Entrepreneurship Research. Revue de l’Entrepreneuriat, 16(1), 47-54.

Jarzabkowski, P., Balogun, J., & Seidl, D. (2007). Strategizing: The challenges of a practice perspective. Human Relations, 60(1), 5-27.

Jarzabkowski, P., Kaplan, S., Seidl, D., & Whittington, R. (2016). On the Risk of Studying Practices in Isolation: Linking What, Who, and How in Strategy Research. Strategic Organization, 14(3), 248-259.

Jarzabkowski, P., Kavas, M., & Krull, E. (2021). It’s Practice. But is it Strategy? Reinvigorating strategy-as-practice by rethinking consequentiality. Organization Theory, 2(3), 26317877211029665.

Johannisson, B. (2018). Disclosing Entrepreneurship as Practice. Edward Elgar Publishing.

Jun, J. S. (1994). Philosophy of Administration. Seoul, Korea: Daeyoung Moonhwa International.

Reckwitz, A. (2002). Toward a Theory of Social Practices: A Development in Culturalist Theorizing. European Journal of Social Theory, 5(2), 243-263.

Robert-Demontrond P., Bellion A. et Beausset T. (2020) Principes, enjeux et limites de la théorie des pratiques pour le marketing, Management & Sciences Sociales, Humanisme & Gestion, 93-105.

Schatzki, T. R. (2002). The Site of the Social: A philosophical account of the constitution of social life and change. Penn State Press.

Schatzki, T. (2018). On Practice Theory, or what’s practices got to do (got to do) with it?. Education in an Era of Schooling, 151-165.

Taskin, L. (2021). Perspectives critiques en GRH. In: Beaujolin, R., & Oiry, E. Les grands courants en Gestion des Ressources Humaines. Éditions EMS.

Thiel, C. E., Bagdasarov, Z., Harkrider, L., Johnson, J. F., & Mumford, M. D. (2012). Leader Ethical Decision-Making in Organizations: Strategies for Sensemaking. Journal of Business Ethics, 107(1), 49-64.

Warde, A. (2005). Consumption and Theories of Practice. Journal of Consumer Culture, 5(2), 131-153.